Capitão América: Guerra Civil foi comentado Formiga na Cabine!
Depois de alguns anos sedimentando seu universo nas telonas, a Marvel, como qualquer franquia hollywoodiana, se vê na obrigação de surpreender. Herói contra herói sempre foi um bom chamariz para os quadrinhos, então seria natural que o cinema chegasse a esse ponto em algum momento. Não é exatamente uma surpresa para quem é leitor há mais ou menos tempo, mas alimenta as expectativas de um público muito mais amplo que paga o ingresso das sessões. No caso específico deste novo exemplar, o fã de longa data também ficou de orelha em pé, já que a base para o filme é uma HQ bastante famosa e polêmica. Capitão América: Guerra Civil (Captain America: Civil War) toma emprestado o nome e algo do conceito de Guerra Civil, história publicada em 2006, escrita por Mark Millar e desenhada por Steve McNiven.
(Aproveitando, falamos sobre a HQ em um episódio do videocast!)
Se você a leu, sabe que a possibilidade de adaptá-la muito fielmente é nula. Primeiro, pelo universo compartilhado dos heróis no cinema ter diferenças significativas em relação aos quadrinhos. Segundo, o que vai para as telas precisa agradar aquele público bem maior citado no parágrafo anterior, portanto, nada melhor do que apostar na receita que esse mesmo público já aprovou e deixar os tópicos mais políticos, sombrios e profundos um pouco de lado. Não que isso seja um defeito em si, de maneira alguma, mas pode frustrar quem esperava um novo caminho para a Marvel do cinema. Feito esse esclarecimento, vamos ao filme!
A terceira aventura do Capitão América (Chris Evans), trazendo de volta os diretores do filme anterior (O Soldado Invernal), Anthony e Joe Russo, coloca o herói patriota contra Tony Stark, o Homem de Ferro (Robert Downey Jr.), seu companheiro no supergrupo Vingadores. O motivo é a exigência que a equipe seja sancionada pela ONU, algo que Steve Rogers – identidade civil do Capitão – é contra por achar que a independência garante a isenção e mantém o foco em salvar vidas. Stark, por outro lado, sofre com a culpa pela destruição e as inevitáveis vidas perdidas quando entram em ação, aceitando o novo modelo sem pensar. A situação fica mais tensa quando o Soldado Invernal é apontado como responsável de um atentado durante a assinatura do Tratado de Sokóvia, que oficializa a submissão dos heróis. Rogers se arrisca a encontrar clandestinamente o antigo amigo, acreditando em sua inocência.
Palco montado! Capitão América agora é fora-da-lei e Homem de Ferro é o garoto do governo. Os demais Vingadores – e outros que chegam depois – escolhem seu lado, formando os dois times ideologicamente antagônicos que, inevitavelmente, vão resolver essa diferença em uma briga de proporções… quadrinhísticas, no melhor sentido da palavra! (Quem for iniciado nas HQ’s, apenas pense agora neste nome: George Pérez). Conforme já foi explicado, muito embora a coisa insinue-se para algo mais sério na primeira metade, sem a quantidade de alívios cômicos característicos da casa, chega um ponto em que o filme se torna aquilo mesmo que já se esperaria da produção. É uma quebra de clima, sem dúvida, mas não chega a incomodar quem já vem acompanhando esses filmes pelos últimos anos, pois temos muitos detalhes a favor que compensam essas eventuais ressalvas.
Com duas horas e meia, o ritmo se sustenta muito bem, seguindo o padrão da abertura com uma sequência de ação. Ainda que este trecho não chegue a decepcionar, a câmera frenética dos irmãos Russo incomoda um pouco nesta apresentação, mas em seguida o filme engrena, auxiliado por uma boa construção do conflito entre os heróis. Surpreendentemente, as motivações estão bem resolvidas no roteiro de Christopher Markus e Stephen McFeely, que também escreveram o segundo filme do Capitão. Ajuda muito o fato dos dois personagens principais terem várias aparições anteriores que delinearam suas personalidades ao longo dos últimos anos, bem diversas por sinal, um contraste bem vindo que faltou em Batman vs Superman.
Sem falar muito, a esperada participação de Peter Parker/Homem-Aranha, agora na pele de Tom Holland, é uma das melhores coisas do filme e, de longe, sua melhor encarnação no cinema. O Pantera Negra, papel de Chadwick Boseman, mais um recém-chegado, também tem uma ótima caracterização e se insere no confronto de uma forma que não soa nada gratuita. O vilão Zemo, vivido por Daniel Brühl, tem sua participação bastante justificada, ainda que sua função na trama nem necessitasse de um vilão das HQ’s, mas o eterno Watson, Martin Freeman, outra presença comentada, só está lá mesmo como (minúscula) participação especial de luxo.
As reviravoltas desta trama, já em seu terço final, são convincentes em parte. Na progressão dos acontecimentos, a direção dos irmãos Russo consegue apresentá-las de uma forma que mantém o pique do filme alto, o que é muito importante, mas durante a própria projeção é possível perceber que determinados estratagemas contra os heróis não fazem muito sentido, contando com uma boa vontade imensa do acaso para funcionarem. Isso acaba diluindo um pouco da graça de algumas pistas falsas plantadas aqui e ali, mas não compromete a diversão super-heroica que todo mundo esperava.
Superando o anterior e Vingadores: Era de Ultron, Capitão América: Guerra Civil entrega uma boa aventura sem arriscar-se muito, conceitualmente falando. Comparando com os outros dois aqui citados, mais Homem de Ferro 3, que insinuaram uma transição deste universo para um tom diferente, este é o que mais se aproxima de trilhar outro caminho, mas alguém vai mexer em time que está ganhando, ainda mais envolvendo milhões de dólares? Enfim, quem não tiver problema com isso, sentirá que seu ingresso foi muito bem pago!