Ao tocar em velhos tabus da sociedade, o razoavelmente polêmico diretor indie Gregg Araki trouxe ao cinema alguns temas e discussões que chamaram a atenção e agradaram parte do público. Mistérios da Carne, com Joseph Gordon-Levitt (A Origem) no papel principal, é um deles e Geração Maldita é outro exemplo de sua filmografia fora da caixa. Não são filmes espetaculares, na humilde opinião deste que vos escreve, mas são questionadores a ponto de serem interessantes realizações, mesmo pouco lembradas.
Seu mais recente trabalho, em discussão aqui neste texto, demorou para chegar ao Brasil, mas como o velho ditado popular nos diz, antes tarde do que nunca. O filme está aí para tentar trazer assuntos de discussão mais ampla como seus anteriores, desta vez através de um melodrama disfarçado de thriller em que o pano de fundo é um mistério a ser resolvido.
Baseado no romance homônimo de Laura Kasischke, a história tem como personagem principal Katrina (Shailene Woodley), uma jovem que acompanha o desaparecimento sem explicações de sua mãe (Eva Green). Katrina e seu pai (Christopher Meloni) tentam colocar a vida em dia após o acontecimento, mas ambos são afetados de formas diferentes e este mistério mal resolvido continuará sendo parte de suas vidas nos anos seguintes.
A ambientação anos 1980 honesta é complementada pelo figurino meio cafona que ajuda a passar a ideia da década sem exagerar. O diretor encaixa bem a trilha sonora da época e o ritmo da narrativa agrada, mas, indo direto ao ponto, a avaliação final que fica após os créditos é a de um filme mediano e pretensioso demais.
A narrativa, que vai e volta no tempo, é até bem montada, mas funciona até certo ponto. Em primeiro lugar, a menção dos anos, para situar o tempo a quem assiste, não é verdadeiramente útil ao espectador, e alguns diálogos descritivos demais incomodam e se tornam desnecessários. Há inserções na trama dos sonhos de Katrina, que são visualmente agradáveis e procuram trazer explicações simbólicas, mas no final das contas não agregam ao plano geral e é aí que mora grande parte da pretensão do diretor, que ainda piora sua situação ao tentar resolver o “mistério” ao final. Algo mais subjetivo no desfecho faria muito mais sentido à proposta do longa.
O ponto mais alto, afinal o filme é mediano e não ruim, é a atuação de Shailene Woodley (Divergente e A Culpa é das Estrelas), hoje em dia bastante requisitada em Hollywood, e a interpretação de Eva Green (Cassino Royale e Penny Dreadful), filha e mãe respectivamente. Woodley confirma que é uma ótima atriz e Green parece inspirada por Elizabeth Taylor em Quem Tem Medo de Virgina Wolf, guardadas as devidas proporções, é claro. Contrapondo isso, Christopher Meloni, mais lembrado como o Elliot Stabler de Law & Order: Special Victims Unit, destoa das duas tentando entregar um personagem lacônico que, com mais esforço, caberia em um dos filmes de Wes Anderson ou Paul Thomas Anderson, mas não convence aqui.
A curiosidade fica para a aparição de Sheryl Lee em um pequeno papel no filme. Para quem não se lembra, esta atriz, hoje quase esquecida, foi Laura Palmer na cultuada série Twin Peaks. Mesmo décadas depois, se você acompanhou a série, provavelmente irá reconhecê-la.
Enfim, Pássaro Branco na Nevasca não deve ser tratado como um filme ruim, certamente, mas há escolhas discutíveis na conduta da história que poderiam ter saídas mais inteligentes. Seu resultado final, mesmo que o argumento tente ser fiel na adaptação do romance, está longe de ser memorável. É opção melhor do que muita coisa que aparece no cinema, mas não deixa de ser somente isso, uma opção…