Frutos de uma experiência governamental camuflada para gerar super-seres, os NM viviam dentro de uma realidade virtual paradisíaca e compartilhada, ignorando que aquilo não era real e que seus corpos físicos eram testados e aprimorados em laboratório. Próximos de serem descobertos, os responsáveis pelo projeto decidem acobertar tudo, primeiro matando todas as cobaias, o que acaba não acontecendo. Nathan, Danny, Jack, Jazz e Bethany sobrevivem e despertam sem a mínima ideia do que está acontecendo, por que são caçados ou por que cada um deles tem um super-poder diferente. Cabe agora a agentes do governo ajuda-los a entender a situação e treinar as habilidades de cada um, mas ainda existe muito a ser descoberto sobre a origem do projeto NM.
A premissa é simples, mas conta com a boa narrativa visual de John Byrne, muito ajustada ao seu traço limpo e claro, o que torna a leitura bastante fluida mesmo quando não há cenas de ação. Pelo menos nestas primeiras histórias, existem algumas redundâncias entre texto e imagem, um vício comum dos quadrinhos de super-heróis dos anos 80, o que é até perdoável considerando época em que a série foi elaborada. Se passou pela sua cabeça que o trabalho é datado, acho que o termo é cabível aqui. Quem tiver algum problema com isso, é melhor passar longe. Mesmo entre os poderes dos personagens, não há grandes arroubos criativos, apenas detalhes colaterais que tornam esses dons um tanto inconvenientes para uma vida normal, mas isso também já não era novidade naquele tempo. Nathan tem a visão capaz de enxergar todo o espectro eletromagnético, porém seus olhos vão gradativamente deformando-se. Danny corre em altas velocidades, mas a musculatura de suas pernas é desproporcional ao resto do corpo. Jack tem super força, mas não pode controla-la. Jazz tem agilidade sobre-humana, e até este ponto da história, é a única que não apresentou nenhuma desvantagem quanto ao seu poder. Bethany é invulnerável a ponto de seus cabelos cortarem como navalhas, mas vai perdendo toda a sensibilidade corporal com o passar do tempo.
A parceria de John Byrne com a Dark Horse foi prejudicada por um evento inesperado. Em 1994, após 31 edições, a série foi interrompida voluntariamente por seu criador. O hiato, que não deveria passar de seis meses, foi bem mais longo que o previsto. NM acabou no limbo por cerca de quinze anos graças à bolha especulativa que estourou no meio daquela década. As vendas milionárias que o mercado comemorava foram desmascaradas, pois nunca houve um título que tivesse um milhão de leitores, conforme os números marcavam, mas sim pretensos investidores que compravam dúzias do mesmo gibi, com suas capas variantes, para guarda-los e revende-los com o preço inflado. Quando a verdade apareceu, a retração era inevitável, portanto, um cenário horrível para trazer de volta esses personagens, que não durariam mais três meses com o mercado em agonia. Para Byrne, a solução foi voltar a prestar serviços para Marvel e DC, em trabalhos bem pouco inspirados.
Em 2007, veio o anúncio de que a IDW assumiria a tarefa de publicar a continuação da série confirmada pelo seu criador, assim como relançar o material antigo. Em 2009, o encadernado John Byrne’s Next Men Vol 1 chega ás lojas dos EUA, contendo as edições de 0 a 10 da Dark Horse. Mais dois volumes foram lançados, terminando o ciclo de republicações. Cumprindo a promessa, as histórias que finalizam a saga também já foram produzidas e publicadas, respeitando a numeração original até o encerramento, na edição 44.
A edição brasileira, lançada pela Mythos, segue o padrão original da IDW. Capa dura com reserva de verniz, papel de maior gramatura em suas 312 páginas e uma boa impressão valorizam o produto apesar do preço salgado de R$ 99,90. Muitos leitores reclamam de alguns títulos lançados em capa dura por aqui, mas neste caso é justificável na comparação com o gringo. A única ressalva fica por conta da tradução, de Jotapê Martins e Fernando Bertacchini. O primeiro é uma personalidade bastante conhecida no meio editorial de quadrinhos brasileiro, cujo trabalho como tradutor costuma incomodar alguns leitores pelas suas escolhas na adaptação de algumas gírias e expressões, entre outras coisas. O que é curioso neste trabalho específico é que os codinomes dos Next Men não foram traduzidos. Entendo que o nome da série realmente seria um problema, pois abarca um significado maior do que a soma das duas palavras, mas é estranho manter palavras em inglês onde não era preciso pensar muito para resolver. Nathan é Scanner -neste caso é aceitável, pois não temos um similar aqui – mas fora esse, Danny é Sprint, Jack é Brawn, Jazz é Bounce e Bethany é Hardbody. Seria algum tipo de exigência da editora ou uma opção equivocada mesmo? Afinal, o mesmo Jotapê assinava uma coluna na saudosa versão brasileira da revista Wizard, publicada pela editora Globo, e na edição 2, de setembro de 1996, o assunto era justamente tradução de nomes de personagens, que ele defendia veementemente, citando exemplos em que foi responsável pela adaptação dos mesmos. Ele estava certo, ao menos no conceito principal, e acho que a ideia continua valendo.
Só para concluir, Next Men Vol. 1 é uma leitura que vale o tempo investido, se você gosta de super-heróis e/ou ficção científica. Além disso, é bem interessante comparar como a forma de contar esse tipo de história mudou de quinze anos para cá. Se a mudança foi para melhor ou pior, vai do entendimento de cada um. Cabem ainda reflexões sobre o momento atual do mercado em relação à época do surgimento desses personagens, por que a IDW resolveu bancar a série depois de tanto tempo e como as grandes editoras não aprenderam muita coisa. Também vale pelo trabalho de um artista que se encontrava no auge da forma. Na torcida para que a Mythos publique os próximos álbuns, junto com a fase mais recente e seu encerramento. Se essas histórias são tão divertidas quanto as primeiras, já está bom demais.