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Habibi – A maturidade de um conto de fadas!

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Habibi

Quem leu a premiada graphic novel Retalhos, de Craig Thompson, deve ter percebido que o quadrinista americano não teve problemas em expor ao mundo todo sua juventude dura e reprimida, além das difíceis escolhas que romperam laços profundos. A coragem dele em retratar sua vida também pode ser vista em Habibi, originalmente publicada pela Pantheon Books em 2011, lançada no Brasil pela Companhia das Letras no ano seguinte, através do selo Quadrinhos na Cia.

Resultado de sete anos de pesquisas e trabalho, o autor nos apresenta o islamismo e as suas tradições. Uma cultura ainda pouco compreendida aqui no Ocidente e que, de certa maneira, colide com a nossa. Craig narra, em forma de parábola, a saga de dois escravos fugitivos, Dodola e Zam, que são unidos e separados pelo destino. A história se passa nos dias de hoje em alguma parte do Oriente Médio e em nenhum momento é mencionado o lugar exato, algo que que ajuda o leitor a sentir a falta de um lar seguro.

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No início, acompanhamos a dolorosa infância de Dodola, que é vendida ainda criança pelos pais para casar-se com um escriba bem mais velho que tira sua virgindade. Após alguns acontecimentos, ela fica responsável por um bebê que encontra no mercado de escravos, o pequeno Zam. E para conseguir comida aos dois, logo aprende as “leis do comércio”, ou seja, passa a se prostituir em troca de uma cesta cheia de comida. Por ser uma mulher em um ambiente hostil e retrógrado, não há nada que possa fazer além de servir os desejos mais sórdidos dos homens. A partir de então, acompanhamos o crescimento e desenvolvimento dos personagens, os laços de amor e cumplicidade entre eles e as trágicas adversidades que enfrentam, envolvendo violência físíca e verbal.

Para ler Habibi é preciso extrair qualquer tipo de moralismo e abrir a mente. Craig não economiza na arte e no roteiro ao representar as relações sexuais, consentidas ou não, a violência em todos os âmbitos e a inerente sensação de hostilidade. A arte não chega a ser totalmente explícita, mas é preciso encará-la com maturidade para entender o contexto, o subtexto e empatizar com os protagonistas. Os traços são minuciosamente detalhados, retratando a imaginação dos personagens. Durante a leitura, é preciso parar várias vezes para analisar cada quadro. Além do traçado, a escolha da arte em preto e branco causa um maior impacto, principalmente em momentos de clímax.

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Para contar a história de Dodola e Zam, o quadrinista usou como referência obras como As Mil e Uma Noites e também recorreu ao Corão. Inspirado na caligrafia árabe, explorou o próprio estilo do livro, e também as narrativas do texto sagrado dos muçulmanos para fazer alusão às histórias que Dodola conta à Zam. Habibi levanta milhares de questionamentos e traz críticas à religião, ao conservadorismo e à sociedade, até mesmo pela imagem que nos é passada do Oriente Médio. Porém, Thompson afirmou em várias entrevistas que a intenção da HQ não é satirizar nenhuma fé ou religião, mas sim, contar apenas uma história de amor que rotulou como “conto de fadas”.

Com 672 páginas, Habibi é uma graphic novel instigante, contundente e, acima de tudo, apaixonante. É difícil ler um capítulo, fechar a HQ e partir para outra atividade sem parar por um instante e refletir sobre a passagem lida. Ao término da última página, a sensação que fica é de liberdade e tudo o que acontece posteriormente naquele universo, é elaborado em nossa cabeça.

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