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Rastro de Cthulhu – As estrelas se alinham novamente!

Grande parte de nós, RPGistas, já ouvimos falar de um certo Cthulhu, seja em board games como Arkham Horror, livros, ou mesmo quadrinhos e séries. Pois vamos falar sobre o Rastro de Cthulhu.

Hoje não traremos aqui um RPG novo, e sim o relançamento de um RPG que foi um sucesso em seu lançamento original em 2010, mesmo com sua modesta tiragem.

Rastro de Cthulhu é um RPG escrito por Kenneth Hite, baseado nas histórias de H.P. Lovecraft, que adota o sistema de regras Gumshoe, de Robin D. Laws. Ele foi lançado em 2010 pela Retropunk, na época o primeiro RPG sobre o Mythos de Cthulhu no Brasil, e que une um excelente cenário com o sistema de regras Gumshoe com suas mecânicas mais voltadas ao narrativismo.

Ele se encontra em financiamento coletivo no Catarse, arrecadando até agora perto de 50% de seu valor de R$ 45.000 – e com cerca de 10 dias para o seu encerramento. Este foi o primeiro projeto da então novata Retropunk, fundada em 2010 por Guilherme Moraes – a editora também foi responsável por títulos como Fiasco e Savage Worlds, além dos nacionais Terra Devastada, Abismo Infinito e A Fita. Lançou também o cardgame Escola de Dragões (junto com sua primeira expansão), produzido por Ramsés Sohn, e começou a se aventurar na literatura com o romance O Amuleto.

O interessante desta publicação é sua origem modesta. Foram produzidos apenas 500 exemplares com capa dura e miolo em sépia e, após seis meses, a primeira edição do livro estava esgotada. Já a segunda edição foi uma versão econômica, em capa mole e miolo em preto e branco. São quase seis anos de Rastro de Cthulhu no Brasil. Mais de um ano e meio com ambas as edições esgotadas – e desde janeiro de 2016, a RetroPunk vem promovendo seu ressurgimento.

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Mas a grande dúvida que vocês podem ter é: será que o jogo é bom? Bem, a linha de Cthulhu coleciona prêmios e indicações ao longo de oito anos de existência. Em 2008, o Livro de Regras recebeu duas medalhas de prata do ENnies Awards na categoria Melhor Regras e Melhor Texto, assim como um menção honrosa como Melhor Produto. O suplemento Os Arquivos Armitage recebeu uma medalha de prata do ENnies Awards como Melhor Aventura em 2010. Os Caçadores de Livros de Londres recebeu medalha de prata do ENnies Awards como Melhor Cartografia em 2011. O Livro da Neblina – O Guia do Investigador para a Londres Oculta recebeu a medalha de ouro do ENnies Award como Melhor Texto e Cthulhu Apocalipse: A Máquina do Apocalipse recebeu a medalha de Ouro do ENnies Award como Melhor Livro Eletrônico, ambos em 2012. Para nenhum cultista botar defeito.

Tentar explorar e passar tudo que o universo do Sr. Lovecraft nos trás é uma tarefa árdua, mas Rastro de Cthulhu o faz com maestria. É sugerido que o jogo seja ambientado na década de 1930, por ser o período onde a maior parte dos contos relativos aos mitos de Cthulhu foram escritos. Mas na verdade, o jogo pode ser ambientado em qualquer época de modo fácil e rápido. No jogo, você se coloca na pele de investigadores, e é ai que começa toda a diversão – pois, de certa forma, nos outros RPGs vocês sempre são heróis ou pessoas destinadas a salvar o mundo. Não que em Rastro de Cthulhu seja diferente, mas é que aqui vocês são apenas pessoas comuns, que não deveriam entrar em contato com os poderes cósmicos – mas que, por algum acidente, o fizeram.

E enquanto em outros jogos os personagens ficam ricos ou famosos, em Rastro de Cthulhu quanto mais a fundo os personagens vão, mais coisas ruins os esperam, até finalmente chegarem a loucura ou a morte. Mas essa é a diversão do jogo – como isso irá ocorrer é o que faz você não querer parar de jogar.

Rastro de Cthulhu também mostra um retrato da sociedade nos anos 30, onde a pobreza, a fome e a guerra eram tão presentes quanto as ameaças dos Grandes Antigos. É apresentada a situação de diversos países (Brasil incluso) e como os Mythos afetavam cada porção do continente, além de dicas para narrar histórias dentro do universo cthulhuniano, juntamente com uma aventura pronta – O horror em Kingsbury, que é baseada em eventos reais (muito interessante e bem construída, por sinal).

O sistema

O sistema Gumshoe, como dissemos, foi criado por Robin D. Laws em 2007, e publicado primeiramente no jogo Esoterroristas (que a própria RetroPunk promete como um próximo lançamento). Esse sistema é especializado para RPGs investigativos.

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O Gumshoe System é projetado em torno da ideia de que cenários de investigação são difíceis de executar com a maioria dos sistemas de RPG. O problema é identificado como se pistas importantes seriam perdidas devido à falha de rolagem nos dados, resultando em uma parada do jogo. Então para resolver isso, o sistema tenta fazer do jogo não sobre achar pistas, mas sim em interpretá-las. A atenção é toda focada no cenário investigativo, fazendo a dinâmica ser encorajadora para os jogadores a assumirem o controle da investigação, centrando assim tudo na figura deles. Um exemplo, é que as rolagens dos NPCs podem ser sucedidas ou falharem conforme o Mestre (aqui chamado de Guardião) achar dramaticamente apropriado.

Para a criação dos personagens, o sistema te dá pontos para que sejam gastos em habilidades – sejam elas gerais ou investigativas. O interessante é que elas variam dependendo do número de investigadores na aventura. O propósito das habilidades de investigação é encontrar pistas para o avanço da história. Essas pistas são chamadas de pistas fundamentais. As habilidades de investigação sempre funcionam – não há rolagem de dados envolvida. Se uma cena contém uma pista fundamental e um personagem usa uma habilidade investigativa que se relaciona com a pista, o personagem irá encontrar essa pista. Já as habilidades gerais são usadas quando um resultado desconhecido é dramaticamente apropriado (por exemplo, o combate). Para estas situações, o sistema utiliza um único dado de seis lados, que é rolado contra uma dificuldade.

Por fim, são definidas as Fontes de Estabilidade – pessoas importantes na vida do Investigador, com as quais ele pode, por algum momento, se esquecer dos horrores vistos e se recuperar do trauma psicológico sofrido – e os Pilares da Sanidade – os princípios em que se acredita, seja a fé religiosa ou a crença na bondade inata do ser humano. Estes parâmetros são importantes para determinar duas habilidades fundamentais no jogo: a Estabilidade  – sua capacidade em suportar o trauma mental – e a Sanidade – que mede o quão próximo se está da loucura, devido ao conhecimento da grande verdade.

O sistema é simples e fácil de usar, e excelente para o que se propõe, que é uma aventura investigativa. No entanto, algumas pessoas podem não gostar dele devido a dois elementos: o modo como ele é ensinado é em torno de exemplos. Sendo assim, a quantidade de tabelas e regras especificas nele são pequenas – e este seria o suposto segundo problema: algumas regras especificas podem não estar no livro quando você precisar dele. Mas nada que o conhecimento de outros sistemas ou o bom senso não possam ajudar. No geral, o sistema é simples e bastante divertido.

O Livro

A estrutura do livro é muito boa, tendo inclusive um apêndice para a conversão dos sistemas antigos de Cthulhu para este. Há também um exclusivo para Fontes de Inspiração – livros e filmes que podem ajudar a entrar no clima dos cultos e deuses envolvidos neste vasto universo.

Um apêndice para o Mestre (Guardião), com tabelas e regras, além de um ultimo apêndice com um breve histórico dos autores do livro, com ilustrações bem humoradas.

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O livro também traz material sobre os deuses do Cthulhu Mythos, criaturas e seitas para serem usadas no jogo – e também encantamentos e magias que irão deixar seus personagens totalmente insanos. A forma como tudo isso é apresentado é uma maravilha a parte, pois são colocados vários fragmentos de lendas e contos – alguns até mesmos opostos, fazendo o Guardião decidir quais deles vão ser usados.

As ilustrações do livro são magníficas e assinadas por Jérôme Huguenin, que traduzem de forma grandiosa todo o espírito do jogo. Ah o livro também é recheado de citações das obras de H.P. Lovecraft.

Infelizmente, nem tudo é um lindo mar de monstros, deuses e cultos. A primeira edição de Rastro de Cthulhu foi um pouco criticada, pois alguns erros de digitação passaram despercebidos, mas nada que pudesse comprometer a leitura dessa obra. E justamente o que essa nova edição promete é a correção destes poucos erros e algumas outras pequenas mudanças.

Vale ressaltar que o universo Cthulhiano – se é que se pode descrever assim – é gigantesco e vasto, rico em material e em complexidade. Mas a RetroPunk consegue trazer um material a altura deste universo!

Além disso, em seu financiamento coletivo, a RetroPunk faz algo inédito pelo menos para as editoras de RPG nacionais – as pessoas que adquiriram as versões antigas de capa mole em preto e branco, terão desconto ao participar de seu financiamento. E não apenas isso, mas uma bela iniciativa de que os livros recolhidos serão doados para bibliotecas públicas e a grupos e locais que promovam o RPG.

Vale a pena conferir a obra antiga e com certeza apoiar esta nova obra.

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