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O Motorista de Taxi – Grande história, filme medíocre!

O Motorista de Taxi traz fato histórico importante, mas falha como boa narrativa

A aposta deu em nada. O Motorista de Taxi (Taeksi Woonjunsa) foi o filme que a Coreia do Sul escolheu para tentar emplacar uma vaga na categoria de Melhor Filme Estrangeiro no Oscar 2018. Como se sabe, não emplacou. O que se apostou, no entanto, foi em uma trama baseada nos acontecimentos históricos que deram início ao processo de democratização do país. Um episódio que ficou conhecido como Massacre de Gwangju.

Crítica de O Motorista de Taxi

O Motorista de Taxi

É maio de 1980 e a Coreia do Sul passa por diversos protestos universitários contra o governo golpista e ditatorial de Chun Doo Hwan. Nesse cenário, Kim (Kang-ho Song, de Expresso do Amanhã) é um taxista de Seul que não apoia os protestos. Ele acha que os estudantes deviam simplesmente se calar e voltar às aulas.

Por outro lado, sempre envolvido em rolos na tentativa de saldar as dívidas que se acumulam, o motorista não hesita em tentar tirar vantagem de algumas situações. Como quando passa a perna em um colega para levar um jornalista da TV alemã até Gwangju, cidade onde os protestos estão mais intensos e que está praticamente sitiada pelo exército. A trapaça é porque Peter (Thomas Kretschmann), o jornalista, está oferecendo uma grande quantia em dinheiro pela corrida de táxi.

Processo de conscientização

Não é difícil imaginar como esta trama vai se desdobrar. O Motorista de Taxi é um filme sobre o processo de conscientização política por meio do choque com a realidade. Entre as trapalhadas para conseguir se comunicar em inglês e o fato de não esperar se ver no meio do fogo cruzado entre estudantes e militares, Kim passa pelo trauma de confrontar a verdade que sempre negou: a crueldade da ditadura e a heroica luta por justiça dos estudantes.

Das boas intenções políticas e históricas, infelizmente, o filme resulta em uma obra bastante frouxa e esquemática. Faltam nuances e desenvolvimento dos personagens, que ficam sempre na superfície do óbvio. Além disso, muitas vezes apela-se para o excessivamente expositivo, deixando pouca margem para o espectador descobrir por si mesmo eventuais sutilezas que enriquecem uma boa trama.

Crítica de O Motorista de Taxi

Um exemplo disso é a questão da ética e da moral no filme. Kim não é apenas um retrato do trabalhador médio conformado com a situação da política e refratário a manifestações. Ele encarna também a moralidade convenientemente flexível dos que praticam ou são coniventes com as pequenas corrupções do dia a dia. Ou ainda com desvios éticos reprováveis, justificados pela necessidade de sobreviver ante as dificuldades econômicas.

Essa carga de ambiguidade do personagem, entretanto, nunca é sutil. A única tentativa do roteiro em criar nuances está em mostrar que ele é um pai que tem dificuldade de criar sozinho sua filha. Mas isso cai mais como apelação sentimental do que como camada de personagem. O que talvez suavize esse problema são alguns choques éticos, como quando ele é duramente confrontado por taxistas de Gwangju por estar aceitando dinheiro a mais pelo trabalho.

Ritmo irregular

No entanto, O Motorista de Taxi comete outros deslizes e o ritmo irregular é um deles. Trata-se do resultado de uma montagem que se abre aos excessos do roteiro, alternando situações confusas com momentos em que se tenta, sem sucesso, estabelecer vínculos entre os personagens. Isso cria cenas desnecessárias e arrastadas, que quebram o ritmo e fracassam no seu objetivo de gerar atmosfera. Ao mesmo tempo, interrompe por tempo demais a ação e o andamento da trama essencial.

A direção não ajuda quando pesa a mão nas tentativas exageradas de extrair lágrimas do público. Principalmente na sequência que é o ponto alto da trama, quando se tenta reproduzir a ação desproporcional do exército contra os manifestantes. A certa altura, tudo nesta sequência fica acima do tom, deixando o exagero roubar sua dramaticidade.

Crítica de O Motorista de Taxi

Na vida real, as filmagens do repórter alemão (cujo nome real era Jürgen Hinzpeter) foram essenciais para dar ao mundo e ao resto do país a noção exata da violência da ditadura da época. A pequena grande história humana por trás disso é a relação dele com o motorista de táxi que o levou até a cidade. A construção dessa relação é, talvez, a maior falha do filme. Uma fragilidade que é a soma da direção frouxa e das atuações fracas.

Com poucas qualidades enquanto cinema, o que resta de importante para este filme é a memória de um episódio que marcou a virada democrática da Coreia do Sul. De resto, são desperdiçadas potencialidades dramáticas como a conscientização política do trabalhador – que aqui fica sempre no nível mais elementar e simplista – e a construção de laços entre um repórter alemão e um taxista coreano. É a grande história perdida em um filme medíocre.

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