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ENTRE NÓS – A vida passa rápido

Embora haja mais de um exemplo de caso bem-sucedido, o reencontro de um grupo de amigos, após um hiato de anos, onde desilusões se revelam apesar de uma superfície que parece perfeita, é um tema que pode facilmente descambar para uma sucessão de diálogos intermináveis aludindo à época que o roteiro percorre, ficando apenas na masturbação verbal. No Brasil, como até, relativamente, pouco tempo atrás víamos muitos filmes batendo nas mesmas teclas político sociais-inutilmente- o risco de uma premissa assim acabar desperdiçada parecia maior.

Entre Nós, de Paulo Morelli, tem essa característica estrutural de lidar com amizades e passagem do tempo, com o acréscimo de um segredo que um dos personagens carrega. O público logo nos primeiros minutos já fica sabendo de tudo, o que o torna cúmplice e estimula a reflexão sobre o certo e o errado no caso. Este aspecto isolado, que permeia o filme todo e toma ares de suspense na expectativa que haja uma descoberta, é o foco principal do filme, mas não é possível classifica-lo apenas em cima disso. A história começa em 1992, mostrando o grupo de amigos no auge da esperança em relação à vida, enterrando cartas que escreveram para aquela ocasião, e que desenterrarão apenas no reencontro. A morte trágica de um deles , durante aquele feriado ou fim de semana, é uma espécie de prenúncio de um futuro não tão animador. Há o salto para a reunião dez anos depois, então aos poucos vão revelando-se os desconfortos de cada um. Insatisfações, fracassos pessoais e a pergunta que paira no ar é: Como tudo chegou a esse ponto? Pelo menos para um deles a resposta é óbvia, mas nem por isso mais fácil de encarar.

Sobre o perigo que o filme corria, descrito no primeiro parágrafo, felizmente ele foi evitado. Os personagens, retornando mais velhos, quando usam um pouco de seu tempo em cena falando sobre o passado e presente, deixam claro que aquilo é um acessório e que o diretor não vê esses tópicos como a razão de ser do filme.  Entre a amargura e a nostalgia sobre o que passou, também há lugar para uma ingênua esperança quanto ao futuro, expressada pela vitória da oposição nas eleições em 2002. A sensação de que deu tudo errado piora por termos o conhecimento desse futuro.

Com alívios cômicos pontuais, bem-vindos e naturais, além de algumas metáforas visuais interessantes, o ponto fraco do roteiro acaba sendo justamente a carga colocada em cima do tal segredo, tratado como ponto-chave do filme. O suspense proposto perde a força que poderia ter, pelo simples fato de que a forma como a revelação acontecerá já está anunciada no início. Chegando ao clímax, o filme nos dá o mais óbvio e nada mais, deixando a sensação de que os aspectos periféricos eram mais interessantes.

Com uma bela fotografia de Gustavo Hadba, sobretudo nas cenas noturnas, e um elenco que convence nos contrastes entre os personagens, Entre Nós é algo que merece crédito por passar bem longe de alguns lixos que o nosso cinema produz. Não tem cara de produto feito para a TV, apesar dos rostos conhecidos, e não trata seu público como idiota, com recursos rasteiros como narrações em off. No entanto, talvez tenha faltado a ele o compromisso de abraçar um gênero e seguir em frente, mesmo que isso significasse ter que deixar de lado algumas boas ideias, que com certeza poderiam ser utilizadas em outro projeto futuro.

P.S.: Se você ainda não viu o trailer, aconselho evita-lo. A minha experiência pessoal ao ver o filme foi prejudicada por ele.

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